segunda-feira, 16 de junho de 2008

Junho

Vazio de palavras e sons. Um oco sem eco. Por fora. Dentro tudo pulsa, grita, reverbera. Turbilhão. Tempestade. Quisera dizer-lhe todos os desaforos calados. Romper o silêncio. Abolir o não dito.
Entardece e tudo é torpor. Nuvens, tédio, imprecisão. Nada desperta, nada é viço, nada... Nada houve, quase nada. Quase um desenho. Nem chegou a ser. Esboço, rascunho, garatujas no papel que se dissolve hoje em algum lixão da cidade cinzenta de breve inverno. Inverno confuso, estação de mentira, como as outras nela. Nunca verão, nunca completo. Estio e chuvas, calor e menos calor. Sempre assim.
Quisera gritar-lhe toda a sorte de impropérios. Os mais baixos, todos os do repertório elaborado na escola pública, na rua, em casa, todos os que anos de literatura clássica não chegaram a suprimir. E o faria sem rubor. Mas não consegue dizer nada além de perdão, por favor, obrigado, com licença. Bom, muito bom. Adestramento feliz, lapidação quase perfeita. Não fosse pelas marcas do tempo.
Vazio. Surdo. Mudo. Cego. Oprimindo o que quis florescer. Esmagando a promessa de sol. Fugindo da dor. Feliz, feliz. Falsamente feliz. Riso, canto, álcool, planos, livros, projetos...
Entardece na cidade cinza. O amor não vingou. Não vingará. Não existiu sequer para se trasnformar. Nem em raiva, nem em pranto, nem em saudade, nem em lembrança, nem em esperança. Tudo é plácido, tudo normal, "tudo na mais perfeita ordem", como dizia o poeta. "Tudo na mais santa paz".


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