quinta-feira, 9 de outubro de 2008

desta noite

Eu queria te contar desta noite. A noite em que eu quis te matar em mim. A noite em que eu quis não te ver a cada momento em que deitava os olhos no céu. Em que quis que tua lembrança fosse não mais que ausência, tempo distante, brevidade. Da noite em que saí de casa e quando voltei não vi mais tua sombra no sofá vermelho, na cama, na cadeira escura, na memória.

Eu queria te contar uma história que não houve. De um tempo feliz em que nos encontramos, em que fomos sós e inteiros, em que nos perdemos sem medo, em que nos reconhecemos e nos demos as mãos.

Eu queria te contar de tudo o que ficou. Do verso derramado manchando a parede branca, da velha canção pairando sobre a casa, da calma amanhecida, do sono compartilhado. Do riso esparso perdido ecoando, iluminando o quarto escuro.

Mas já inventei de ti em mim uma presença tão funda, que mais não posso inventar.

Só te posso dizer da noite em que sobreviveste. Em que deixaste tua sombra à minha espera na mesma sala vazia, na mesma cama, no mesmo sofá vermelho.

E de uma saudade muda do que não fomos.

Um comentário:

mutum disse...

Ainda bem que"a vida é muito dinâmica" e você voltou com seus belos textos.