terça-feira, 29 de julho de 2008

Da fogueira das vaidades e do anonimato

É complicado viver em uma cidade que cresceu depressa, onde ainda impera o pensamento provinciano. Tenho visto cá e lá, navegando na internet, de concidadãos, em páginas interativas, discussões tão plenas de citações quanto estéreis, sobre o sexo dos anjos, a morte da bezerra e temas afins. Trocas de farpas, competição, uns tentando se sobrepor aos outros, sem perceber que ainda que diferentes, para todos haverá espaço. Por trás dessas rinhas, para qualquer observador atento, vaza a intenção real dos interlocutores: a vaidosa afirmação de um presumido conhecimento. Aí ele se perde do seu fim mais nobre: a partilha. O conhecimento, creio, só tem sentido quando e se compartilhado, distribuído, democratizado. Mas cada um desses exibicionistas - pseudo-intelectuais de plantão - se esmera em apenas enumerar suas qualidades de leitor, de cineasta, de teatrólogo, de fazedor de arte. Acrescentando o quê a quem?

Quem nasceu e cresceu em cidade pequena e teve depois a experiência de viver em metrópole, sabe o que é o anonimato. É doloroso, é solitário, mas poucas vivências são tão enriquecedoras. Isso é: para quem sabe delas tirar lições. Longe dos seus, das suas referências todas, sem conhecer ninguém, sem ter com quem trocar palavra, sem ter com quem contar, você se dá conta do que realmente é ali: nada. Ninguém. Você percebe que aquele pequeno universo onde está inserido não dará pela sua falta se você sumir. Que tudo continuará tal e qual. Que a vida seguirá seu curso, malgrado o seu desaparecimento.
A partir daí é possível se reinventar. Perceber o que realmente conta. Ser percebido por quem você é. Sem títulos. Sem reverências. Despido. Ser querido ou querer, por afinidade, empatia, qualidades humanas. Fora da superficialidade da fogueira das vaidades, da afirmação da bagagem adquirida.
O anonimato ensina, entre outras coisas, que todos, todos os saberes, provenientes dos simples ou dos consagrados, hão de ter seu valor.


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