terça-feira, 15 de julho de 2008

Da solidão

A lua crescente acende a escuridão. Ninguém por perto. É longo e estreito o caminho até a madrugada. Guardo o leito, antes por desuso que por repouso. Os gatos sabem de tudo. Desvendam as noites, ruas, telhados, desdenham os segredos alheios que testemunham de passagem, indiferentes, majestosos como só os felinos sabem ser. Na esquina, travestis disputam clientes, aos gritos ou tapas - dependendo do humor e do faturamento - enquanto a polícia faz de conta que faz a ronda. O calor aumenta, suportável porém. O bar, fechado; as casas, silenciosas; outras casas e ruas, salas, quartos, cidades. Tudo é igual e tudo é diverso. Haja fome ou fartura, desejo ou torpor, bombas ou silêncio, as solidões se parecem, as alegrias se parecem, os medos e coragens se parecem.
A lua crescente não me traz o que eu queria. Que há de novo nisso? É comum querer o que não há, o que não está, o que não vem. Ela me traz à lembrança, tão somente, palavras de Paul Valéry: “as pessoas se diferenciam pelo que aparentam e se assemelham pelo que escondem. Os abismos são muito parecidos. A vegetação que os cobre é que os faz diferentes”. Ao som do toque de recolher, lhe digo até amanhã. E como tantos outros insones, digo boa noite ao amor que não tenho.


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