sábado, 5 de julho de 2008

do sonho e do mar

Cabelo ao vento, correndo, correndo, sem nunca chegar ao fim da calçada. Do lado esquerdo, a praia. Lado direito, não sei. O sonho se repete desde a mais tenra infância. No despertar, a impressão de ter passado a noite inteira correndo. Cores nítidas, azul vivo, cheiro de alga. Nunca entendi esse sonho nem o porquê das repetições, espaçadas porém. Aos cinco anos, talvez aos 12, aos 20, depois também. Sempre há pessoas, sempre andando no sentido contrário, nenhuma delas conhecida.
Conheci o mar tarde, apesar de ter nascido no litoral. Depois de um dia de molho e uma noite sentindo como que o balanço de um navio, depois de acordar mareada, fiquei preferindo a areia. Pisava a espuma, que nesse tempo era branca, percorrendo a praia inteira, a pequena praia de Miami-RN, extinta com a construção da via costeira. Na expedição, o olhar surpreso sobre as formas, cheiros e cores que se descortinavam à minha frente. Eram algas parecidas com alface ou cachos de uva em miniatura, em verde-folha, escarlate, marrom. Conchas e estrelas, caravelas azuis, rôxas, transparentes, marias-farinha cor de areia correndo de ré, de lado, desaparecendo na espuma da beira-mar. Mais tarde outras praias, não urbanas, de outras paisagens, coqueirais ao norte, falésias ao sul, acampamentos, violão, fogueira, luar, aguardente branca e áspera, mundo girando, noites estreladas de estrelas dançantes.
Muitos anos passados, morei longe do mar. Andava pela cidade e me perdia de quando em vez, de propósito, escolhia uma direção e imaginava que seguindo sempre encontraria mar ou rio. Encontrava, um rio enorme, poluído, cheio de pontes, barcos e água escura. Sonhava com o mar, sentia necessidade orgânica do mar, de estar perto dele, sentir seu cheiro, seu sal.
Quando voltei à minha cidade natal, não o busquei muito, me contentava em saber que ele estava perto.
Ontem sonhei novamente correndo ao longo da praia desconhecida. Vendo-o ou não, o mar sempre volta. Voltam as ondas, volta a lembrança, volta a infância com cheiro de alga; como depois do maremoto, a calmaria. Como depois da tristeza, a esperança.


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