domingo, 3 de agosto de 2008

Palavras

Eu já o tinha visto, muitas, muitas vezes, o moço bonito.
Nem tão simpático, tampouco o contrário. Aparentemente recatado, meio tímido, meio distante, meio blasé.
Tinha pressentido algo mais, um pouco do profundo aflorava da capa. Sutil. Foi há tempos. E foi só.
Sumiu. Esqueci.
Um dia, fortuito, ele voltou diferente. Meu olhar também. Comecei a esmiuçá-lo, invasiva, loba em êxtase com a fartura do banquete oferecido. Vísceras em exposição, vi-o, em parte, pelo avesso. A partir de dentro. Daí me agradou, e me agradou em profundo. Devorei dele o que pude. Esclareço: palavras - eram palavras – e nelas, alma e dor, vivência e gozo, invenção e memórias. O mais não perdeu a beleza, mas não foi o que ali, naquele encontro, me manteve atenta.
Ficou então fazendo parte dos meus dias. Uns tempos, amiúde. Noutros, espaçadamente. Noutros mais, ausente, ressurgindo depois de quando em vez. Integrei-o às minhas próprias palavras, agradecida. Tema. Canção. Idéia.

Gosto das trocas. Das boas. As que somam. Quis retribuir mas não sabia como. Não havia muito o que eu pudesse dar. Era um tempo sem luz, denso e de despedida, e ele me dizia que a dor não é privilégio de alguns. Meio fênix, meio otimista, andei buscando veredas para sair do escuro. Só pude oferecer o que tinha à mão no momento, pelo tanto que ele já havia me dado: palavras.

Mas em verdade, em verdade, confesso: ainda quis dele também, de quebra, um outro olhar.

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